O silêncio dos intelectuais

Estava vendo agora o programa da TVE "O silêncio dos intelectuais" (aliás, TVE e TV Cultura são boas demais, se você selecionar os programas - recomendo também o "Recorte Cultural" e "Café Filosófico", respectivamente). O programa tratou da questão do poder da mídia. A TV, a tela do computador ou do celular ditam o que é o real. Os recortes instantâneos que não são nada além do que a percepção individual de alguém, ou o modelo padrão para esses meios midiáticos. Mas são confundidos pela maioria dos "espectadores" com a própria realidade... Um intelectual francês estava falando nesse programa que se você meciona o Zidane pra qualquer ser no mundo, ele é reconhecido, enquanto que um matemático francês extraordinariamente jovem e brilhante, vencedor da medalha Fields (equivalente ao Nobel de Matemática, entregue apenas de 4 em 4 anos) não se conhece em lugar nenhum. (Nem na internet achei esses dados direito...) O Zidane cabe na tela, cabe no jornal, cabe na copa transmitida ao vivo pro mundo todo... É visão. É padrão. Mas e a Matemática? Filosofia e poesia ainda há em raros programas de TV e nesse maravilhoso e democrático meio que é a internet... Mas Matemática talvez nem aqui. É puro pensar, "episteme" grega, longe da "doxa", sensação, em que estamos constantemente mergulhados, onde tudo passa rápido e pronto e dado. Não temos nunca tempo nem disposição para silêncio, para pensar sozinho, estudar profundamente algo e - claro - menos ainda para criar. Por isso também é que os intelectuais parecem silenciosos, segundo o programa. Não cabem nesse esquema de mídia, logo ficam quietos ou em guetos. A meu ver, eis aí o grande risco de quem pensa ou escreve ou faz matemática, de quem cria de maneira geral: falar para cada vez menos gente. E penso que esses guetos tendem a se estreitar, se encolher. Por isso gosto da Marilena Chauí, que fala mais claro que a maioria (no programa, inclusive). Não é preciso usar um vocabulário tão cheio de requintes como a maior parte dos intelectuais faz... Acho que o mesmo problema há na poesia mais "aceita" pelas editoras hoje. Por isso, tende a só ser apreciada por poetas. Tento fugir desses "hermetismos pasquais" nas minhas. Apóio o retorno ao mais popular e simples, sem ser simplório, como Quintana na poesia, Beethoven na música clássica, Chauí na Filosofia. Mas sem os excessos também... Cabe aqui a "justa medida" Aristotélica ou o "caminho do meio" do Buda. As auto-ajudas imbecis são tão claras quanto as cabeçadas do Zidane, mas aí já começa a faltar a profundidade... ;)

(Fabio Rocha)