A sexualidade como prazer

A sexualidade como prazer - Fabio Rocha


Na teoria geral da sexualidade, tudo se une na psicanálise. É como uma base fundamental. O conceito de sexualidade foi se transformando ao longo do tempo na obra de Freud. Sexualidade é qualquer ação ligada ao prazer, não necessariamente no genital, ou ligado ao ato sexual. Pode ser entendido como um prazer qualquer, em qualquer área. Ao entender seu prazer e seu desejo, o indivíduo em análise passa a ter uma nova qualidade de vida.

A sexualidade, o prazer, instaura na vida de cada pessoa vergonha e culpa. Até falar para si mesmo dos seus desejos, reconhecer o que desejam é algo gradual, leva pelo menos meses de psicanálise. A origem da repressão (consciente) e do recalque (inconsciente) vem da infância, no momento onde há o Édipo, o não poder viver o que se deseja e depois na castração (na criança de 4 ou 5 anos). Na maioria das vezes, não há um contato ao longo da vida sem entrar em contato com seu desejo e sua sexualidade. Gerando sofrimento, sintoma e neurose.

O desejo mais proibido, não realizado e não expressado com as figuras paternas, tende a se repetir ao longo da vida em todas as relações amorosas. Sempre deixando uma sensação de não satisfação completa, não realização completa (além da renúncia que vem com cada escolha). O desejo (energia libidinal) é alheio a moral e também incontrolável (irracional). Se não se manifesta de uma forma, se manifesta de outra. A busca pelo prazer, o desejo, a libido é o que nos move, que nos faz buscar algo na vida.

Essa busca sem fim e sem satisfação plena me lembra a imagem budista da roda da vida e aqui podemos traçar um paralelo interessante. Porém, enquanto para Freud essa busca em objetos externos pelo prazer nos move e é saudável, no budismo a solução é outra: parar de buscar fora. Com as práticas de meditação, muitas vezes com técnicas de imobilidade corporal e silêncio, voltar a um estado natural de paz, plenitude e o que chamam de felicidade genuína ou não condicionada (a objetos externos).

O desenvolvimento psicosexual determina a personalidade do indivíduo. É composto das fases: oral, anal, fálica (até mais ou menos 7 anos de idade, fases mais importantes na formação do caráter), seguido pelo período de latência e fase genital (adolescência). Sempre que a pessoa não pode expressar e viver livre e plenamente as 3 primeiras fases (impedimentos e frustrações), formam-se as fixações (ou traumas). Com essas fixações, a forma de ver o mundo e a si mesmo é alterada. As fantasias de ideal são criadas. A própria base da personalidade é formada com essas vivências em excesso ou em falta. Na fase oral - passividade em excesso, sofre por não ter tudo à mão. Na fase anal - controle em excesso, sofre quando não fazem tudo como ela quer, gosta de impor limites, expulsar, reter, controlar. Na fase fálica - preencher (querer relações onde preenche totalmente ou é preenchido totalmente). É muito interessante que - mesmo sem falar da infância nas sessões de psicanálise - vai-se percebendo que ele sempre tende na vida presente a buscar o que faltou na infância, em seu passado remoto, naquelas três fases constituintes.


Transferências, pulsões e desejos

Transferências, pulsões e desejos - Fabio Rocha


Na primeira vez que Freud falou de transferência, foi no sentido de realizar nos sonhos desejos que não poderiam ser vividos acordados. Depois, falou da transferência em relações dos afetos de pai e mãe para novos relacionamentos. Mas vamos nos aprofundar aqui na transferência no setting analítico (espaço da transferência) repetimos fatos da infância, revivemos como adulto, ressignificando algo do passado. O que pareceu um abandono, por exemplo, do pai, para uma visão de que ele fez o que era possível na época. O inconsciente traz de volta imagens e informações da infância e através da elaboração do analisando e da superação de suas resistências. Há uma recriação do passado muito baseada no acolhimento e no afeto do analista (afeto através da escuta, com ética, liberdade e confiança e gradativamente - não é de uma hora para a outra, respeitando o tempo,  a alteridade do analisando). A transferência é desse afeto das figuras importantes da infância do analisando (pai, mãe ou quem o criou diretamente, que Freud chama de “objetos primários”) para o analista. E a psicanálise pode transformar a vida das pessoas através de uma nova vivência e visão de seu passado. Sem transferência, não há psicanálise. A transferência vincula e aproxima.

As pulsões nascem no inconsciente e são sempre contingenciais, segundo Freud, nunca realizadas (sempre buscando prazer e realização). Acabam sempre mudando de um objeto representacional para outro, nunca dando uma satisfação total e nos mantendo em movimento (muito resumidamente, o que é chamado no budismo de “samsara”). Muitas vezes se mostram em desejos não bem aceitos pela sociedade, difíceis de lidar pelo analisando. Através de uma estrutura ética, de não julgamento e de acolhimento, o analista deve aceitar qualquer desejo do analisando e estimulá-lo a falar sobre tudo. A pulsão difere do instinto, que é necessário para nossa sobrevivência básica. Por exemplo: comer, beber água ou dormir. A não realização de uma pulsão gera sofrimento. Quanto mais energia psíquica colocada na realização de uma pulsão, maior o sofrimento. 

Na contemporaneidade, onde o excesso de marketing e de redes sociais, o analisando se perguntar o que ele realmente quer é algo muito importante, daí a relevância da psicanálise. Passamos do desejo dos pais para o desejo do marketing, o desejo dos padrões, a competição (beleza, salário, viagens, sucesso etc.), sem nos fazermos esta pergunta básica. Através dos instrumentos da psicanálise, do olhar para si mesmo, muitas vezes pelos desejos da infância, podemos iniciar a tomar posse e acolher o nosso próprio desejo. Melhoramos essa relação conosco mesmo, perguntamos mais “por quê?” Com isso, as frustrações passam a trazer uma dor menor, diminuímos nosso sofrimento através de um novo olhar, utilizando novas ferramentas. 

Dentro da teoria freudiana, há inicialmente 4 fases da teoria pulsional:

  1. Prazer e agressividade ou violência: identificação dos reais desejos do analisando, sem julgamento dos mesmos (sexualidade e lidar com a raiva)

  2. Autoconservação: melhor relação consigo mesmo e com o meio onde está inserido o analisando (reconhecimento, sucesso e fracasso - sobrevivência)

  3. Pulsão de vida: como o analisando lida com suas frustrações e idealizações (relação com objetos representacionais - contingenciais - e com a sexualidade)

  4. Pulsão de morte: aceitar a si (relação com angústias e fetiches - canalizar a pulsão para algo mais bem aceito socialmente)