Abandono das figuras parentais - reflexos nas relações amorosas e como melhorar segundo Jung

Abandono das figuras parentais - reflexos nas relações amorosas e como melhorar segundo Jung - Fabio Rocha

( Resumo inspirado no artigo: https://www.scielo.br/j/estpsi/a/wn6nHN5SkWwYpnW3frsfHyP/ )

OBS.: Trato aqui de filhas e pais, porém podemos pensar no mesmo com o Édipo - filhos e mães.

Pontos em comum: Pai ausente (abandono) ou presente, porém muito severo, crítico, autoritário ou abusivo (negligência/omissão/descaso). 

Sintomas em comum: Falta de autoconfiança, melancolia, depressão, compulsão à repetição* em relações românticas (Na falta da relação infantil com uma boa imagem masculina, tentam preencher essa lacuna afetiva infantil com parceiros que gerem submissão e dependência.)

Solução de Jung (através da terapia): Desenvolvimento dessa figura masculina que faltou no pai em si próprio, individuação. Maior equilíbrio psíquico entre as polaridades masculina e feminina. Não mais na repetição de relacionamentos românticos com figuras de abandono.

Como se dá a cura: ao invés de repetir nos relacionamentos, para "reviver" e curar a ferida emocional (tentativas inconscientes de cura), a repetição se dá através da fala na psicologia analítica.

* Compulsão à repetição é um fenômeno do psiquismo que se caracteriza pela tendência inconsciente de REPETIR algo que não foi bem resolvido, tentando reintegrar um elemento alheio em que o indivíduo ficou fixado.

Vídeo para pais atualíssimo, considerando os malefícios do celular e da falta de limites e o índice alarmante de aumento dos suic*dios em crianças e adolescentes:
https://youtu.be/wXPde553o-U?si=G3S5kMxQSA_ljI0r


A interpretação dos sonhos de forma prática na clínica contemporânea

A interpretação dos sonhos de forma prática na clínica contemporânea - Fabio Rocha


Percebendo a distância entre a realidade da clínica, como paciente há 30 anos e também como psicanalista, me instiguei a escrever esse texto, complementando este post sobre sonhos.

Precisamos debater isso e entender porque houve quase um bloqueio na transmissão da Psicanálise no tocante à interpretação dos sonhos pela análise de suas partes, sendo uma técnica muito pouco utilizada em profundidade na clínica contemporânea. Talvez isso tenha ocorrido pelo tempo demandado para uma decomposição de cada símbolo exposto no sonho... Ou pela energia demandada por um trabalho assim. Um analista com muitos pacientes simplesmente não aguentaria trabalhar tão a fundo tantos conteúdos tão complexos sem se perder totalmente. (Por isso, acredito ser melhor trabalhar priorizando a qualidade, com poucos pacientes, na Psicanálise). Zimerman, porém, vê isso como uma evolução natural na Psicanálise: "Na atualidade, as coisas não se passam mais assim, pois o levantamento arqueológico cedeu lugar a uma valorização do sonho como um importante método de comunicação, de sorte que o analista está mais atento ao 'todo.' " (Manual de Técnica Psicanalítica. p. 426)

Mesmo tendo Freud chamado os sonhos de "via régia (principal) para o inconsciente", deixando claro que essa seria uma das técnicas mais importante da Psicanálise. Mesmo com Jung reforçando essa importância, apontando o bom hábito de anotar os sonhos em detalhes logo ao despertar (antes da censura / barreira egóica poder começar a agir! Quanto mais cedo se anotar ou gravar em detalhes os sonhos, melhor, pois isso vai se perdendo com o tempo pela ação do ego ao longo do dia) como uma forma acessível a todos de ter um maior contato com seu inconsciente. E de lembrar cada vez mais de mais sonhos em detalhes.

Quase nenhum psicanalista, hoje em dia, utiliza o tempo da sessão para analisar - decompor detalhadamente - os elementos de cada sonho de cada um dos analisandos, como propunha Freud. Reforço que Freud não recomendava analisar o sonho como um todo, menos ainda seu significado na cultura, ou o significado geral de seus elementos, conforme o senso comum. Há até livros sobre o significado “correto” de cada sonho ou objeto sonhado, do tipo “o mar significa sentimento”, que não faz nenhum sentido do ponto de vista da Psicanálise. Cada sonho, cada paciente, cada elemento do sonho, varia! E o que importa é seu significado para aquele analisando, nunca um significado geral. Outro detalhe importante que Freud nos aponta é que a atenção do analista deve estar nas palavras. Não nas imagens trazidas pelo analisando. Todo o estímulo do psicanalista deve ser voltar mais para as palavras usadas pelo analisando. Isso nada mais é do que a técnica de atenção flutuante proposta por Freud para toda análise!

Vou exemplificar com o mínimo de teorização possível, para que fique fácil de entender o que claramente falta hoje na clínica psicanalítica e proponho um debate sobre isso (podemos conversar mais nos comentários).

Dois conceitos básicos que ocorrem no que Freud chamou de "elaboração onírica": a verdade que o ego não suporta é expressa de maneira disfarçada no sonho, onde há DESLOCAMENTO (exemplo: sonhar com um cálice, como o da música de Chico Buarque, para não aparecer diretamente a palavra "cale-se", que o ego por qualquer razão não "quer ver") e CONDENSAÇÃO (A condensação é quando deslocamentos se fundem / fusionam / condensam. Exemplo: quando se sonha com uma pessoa, mas ela parece ter o aspecto de outra e estar vestida tal como uma terceira pessoa, isso pode ser uma condensação das três pessoas).

Reforçando: há deslocamento e condensação. Então, o papel do psicanalista é ajudar a decompor (isso é que é analisar algo, decompor em partes menores) algo condensado pelo inconsciente no conteúdo manifesto do sonho (sem desconsiderar os deslocamentos) em diversos elementos oníricos, que devem ser amplamente analisados.

Exemplos de apenas UM sonho de UM analisando decomposto (e ainda com muito mais coisa a analisar!): 


SONHO:

- "tornado na casa da avó" - finitude da avó, do passado, da infância. lembrança da primeira coisa que vem à mente: a frase "o vento leva". outra lembrança livre que apareceu: o analisando brincando com folhas e fingindo voar na casa da mesma avó. outro aspecto do símbolo do vento: "como segurar o vento?" - o inevitável.

- "a casa caindo em ruínas lentamente" - parecendo um filme, primeira imagem ligada a palavra casa: "proteção". outro ligação: "medo de crescer" (crescer seria perder alguma proteção para este analisando) - outro deslocamento para uma simbologia da casa sendo destruída - indo pelos ares.

- "tento segurar o telhado" - esforço de reter algo que não dá. como momentos bons. lembrança da casa como local bom na infância. esforço sempre vão. outro símbolo para telhado, primeira palavra de que o analisando lembrou: "proteção"

-  "mas morro" - a finitude tocando tudo, aqui não mais apenas a infância, mas a própria vida. de forma incontrolável. outro deslocamento que apareceu, pela repetição da palavra "morro". Não mais como verbo. Morro como substantivo, sinônimo de "colina" ou "monte". deslocamento possível (talvez o mais belo deste sonho) de Moisés recebendo as tábuas da lei no monte Sinai. religião. reconexão consigo mesmo.

- "e estranhamente fico bem depois de morto" - primeira palavra que veio à mente do analisando: "relaxar". entrega total quando nada mais há a perder. desistir. deixar ir. o relaxamento maior é a morte. outra: medo de perder para a morte a última avó viva do analisando. o estranhamento era: "morrendo eu não deveria estar sofrendo? não deveria estar preocupado? que estranho eu aqui bem." (após uma reconexão consigo mesmo) 

OBS.: Este analisando estava numa fase da vida (até mesmo pela ajuda da psicanálise e de outras terapias) onde se sentia "se encontrando", se reconectando mais com seu desejo, incorporando e aceitando melhor traumas do passado e se permitindo conhecer, inclusive, novas práticas religiosas. Notem quanto material condensado e deslocado em apenas um sonho.

A importância da Amamentação e do Holding na visão Psicanalítica

A importância da Amamentação e do Holding na visão Psicanalítica - Fabio Rocha

A importância da amamentação na perspectiva psicanalítica é amplamente reconhecida. A relação entre mãe e bebê durante a amamentação é considerada uma das primeiras experiências de vinculação emocional, proporcionando segurança e estabelecendo as bases para o desenvolvimento saudável do indivíduo. De acordo com a psicanálise, a amamentação desempenha um papel crucial na construção da identidade e na formação da personalidade do bebê. Durante esse período, ocorre a satisfação das necessidades básicas do bebê, promovendo a sensação de completude e segurança emocional. A amamentação também facilita a conexão afetiva entre mãe e filho, estabelecendo uma base sólida para a confiança e o amor. A falta de amamentação ou a interrupção precoce desse processo podem levar a uma série de problemas emocionais e psicológicos. O prazer da mãe em amamentar também é importante e parece ser percebido pela criança. Um exemplo é o transtorno de personalidade borderline. Pacientes com esse transtorno frequentemente apresentam dificuldades na regulação emocional, instabilidade nos relacionamentos e uma sensação profunda de vazio. Acredita-se que a falta de uma experiência de amamentação satisfatória possa contribuir para o desenvolvimento desses sintomas, pois a relação mãe-bebê não foi adequadamente estabelecida nos estágios iniciais. A dependência emocional também pode ser influenciada pela falta de amamentação adequada. A amamentação cria uma sensação de conforto e segurança para o bebê, fornecendo uma base (segurança, conforto etc.) para a autonomia e a independência emocional posteriormente. Quando essa experiência é negada ou insuficiente, a criança pode desenvolver uma tendência a buscar constantemente a aprovação e a segurança emocional em outras pessoas, tornando-se dependente de relacionamentos íntimos para suprir suas necessidades emocionais básicas. Quanto ao período mínimo recomendado para amamentação, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) recomendam a amamentação exclusiva nos primeiros seis meses de vida do bebê. Isso significa que o bebê deve receber apenas leite materno, sem a introdução de qualquer outro alimento ou líquido. Após esse período, a amamentação deve ser complementada com alimentos adequados e nutritivos, continuando até pelo menos os dois anos de idade. É importante ressaltar que a psicanálise reconhece a amamentação como uma experiência fundamental para o desenvolvimento psicológico saudável do indivíduo, mas também reconhece a complexidade das interações humanas e a multiplicidade de fatores que podem influenciar o desenvolvimento psíquico. A amamentação não é o único determinante do equilíbrio emocional e da formação da personalidade, mas desempenha um papel significativo nos estágios iniciais da vida.

Do ponto de vista psicológico, os malefícios de um tempo insuficiente de amamentação podem incluir:

Impacto na formação do vínculo afetivo: A amamentação cria uma oportunidade para a mãe e o bebê se conectarem emocionalmente. A falta de amamentação adequada ou a interrupção precoce desse vínculo podem afetar negativamente o desenvolvimento emocional e a segurança emocional do bebê.

Estresse e ansiedade: A amamentação libera hormônios, como ocitocina e prolactina, que promovem sentimentos de relaxamento e bem-estar tanto na mãe quanto no bebê. A falta desses momentos tranquilos e reconfortantes pode levar a níveis elevados de estresse e ansiedade em ambos.

Autoestima materna: Para muitas mães, a amamentação é uma experiência gratificante e fortalecedora, que contribui para sua autoestima e confiança como cuidadora. A impossibilidade de amamentar ou a amamentação insuficiente pode levar a sentimentos de culpa, frustração e diminuição da autoestima.

Desenvolvimento emocional do bebê: A amamentação é uma forma de comunicação não verbal entre a mãe e o bebê, permitindo que o bebê aprenda a reconhecer e responder às necessidades emocionais. A interrupção precoce da amamentação pode dificultar a capacidade do bebê de regular suas emoções e lidar com o estresse.

Além da importância da amamentação na perspectiva psicanalítica, outro conceito relevante é o do "holding". Esse termo, cunhado pelo psicanalista britânico Donald Winnicott, refere-se à capacidade da mãe (ou cuidador) de proporcionar um ambiente seguro e acolhedor para o bebê durante os primeiros estágios de desenvolvimento.

O holding envolve tanto o aspecto físico quanto o emocional. Fisicamente, significa segurar e sustentar o bebê com cuidado, garantindo sua proteção e bem-estar. Emocionalmente, envolve estar presente de forma atenta e sensível às necessidades do bebê, oferecendo-lhe conforto e apoio emocional.

Na perspectiva psicanalítica, o processo de holding é fundamental para o desenvolvimento saudável do bebê. Ele fornece um ambiente seguro e confiável, permitindo que o bebê explore e experimente o mundo de forma segura. O holding adequado contribui para a formação do senso de identidade e da capacidade de confiar nos outros, estabelecendo as bases para relacionamentos interpessoais saudáveis no futuro.

A falta de holding adequado pode resultar em problemas psicológicos, como a dependência emocional mencionada anteriormente. Quando o bebê não recebe o apoio emocional necessário durante os estágios iniciais, ele pode desenvolver uma sensação de insegurança e desconfiança em relação aos outros. Isso pode levar a dificuldades na formação de relacionamentos saudáveis, dependência excessiva dos outros para suprir suas necessidades emocionais e dificuldades em lidar com a separação e a autonomia.

Além disso, a psicanálise destaca a importância da relação mãe-bebê como um todo. A qualidade do vínculo emocional estabelecido durante a amamentação e o processo de holding influenciam diretamente o desenvolvimento psicológico da criança. Essas experiências precoces são internalizadas pelo bebê, formando modelos internos de relacionamento que moldam sua maneira de se relacionar com os outros ao longo da vida.

A falta da função materna, entendida como a ausência ou insuficiência de cuidados e vínculo emocional adequados por parte da figura materna, pode ter um impacto significativo no desenvolvimento psicológico da criança, incluindo o desenvolvimento de autismo e de melancolia, além do transtorno borderline. No entanto, é importante destacar que o autismo e a melancolia não são causados exclusivamente pela falta da função materna, mas sim por uma combinação complexa de fatores genéticos, biológicos e ambientais. Autismo: O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por dificuldades na comunicação social, interações sociais restritas e padrões repetitivos de comportamento. Sua origem é multifatorial e ainda não totalmente compreendida. Estudos sugerem que fatores genéticos desempenham um papel importante na predisposição ao autismo. Melancolia: A melancolia, também conhecida como depressão melancólica, é um transtorno do humor caracterizado por tristeza profunda, perda de interesse e prazer nas atividades, alterações do sono e do apetite, além de sentimentos de culpa e baixa autoestima. A melancolia tem uma etiologia complexa e multifatorial, envolvendo fatores genéticos, biológicos, psicológicos e ambientais. A falta da função materna pode ser um fator de risco para o desenvolvimento da melancolia, mas não pode ser considerada sua única causa. É importante ressaltar que a formação de vínculos seguros e afetivos é crucial para o desenvolvimento saudável da criança. A figura materna desempenha um papel importante nesse processo, fornecendo cuidados, afeto, segurança e estímulos adequados. A falta desses elementos pode ter um impacto negativo no desenvolvimento emocional da criança e aumentar o risco de problemas psicológicos.

Em suma, a amamentação e o processo de holding desempenham papéis cruciais na perspectiva psicanalítica. Eles fornecem os alicerces para o desenvolvimento emocional e a construção da identidade do indivíduo. Através dessas experiências, o bebê aprende a confiar nos outros, a regular suas emoções e a estabelecer relacionamentos saudáveis. Portanto, é fundamental garantir um ambiente acolhedor e estimulante nos primeiros estágios da vida, promovendo a amamentação adequada e o processo de holding para favorecer um desenvolvimento psicológico saudável.

P.S.: Além dos benefícios psicológicos, a amamentação oferece uma série de vantagens para o bebê devido às propriedades únicas do leite materno. Ele contém todos os nutrientes essenciais para o crescimento e desenvolvimento saudável da criança, além de componentes imunológicos que protegem contra infecções e doenças. Estudos têm mostrado que bebês amamentados exclusivamente têm menor risco de desenvolver infecções respiratórias, gastrointestinais, otites, alergias, obesidade e doenças crônicas, como diabetes e hipertensão, ao longo da vida. Quando o tempo de amamentação é reduzido ou não ocorre de forma exclusiva nos primeiros seis meses, há um aumento nos riscos para a saúde do bebê. Vejamos alguns dos malefícios associados a um período insuficiente de amamentação: Maior suscetibilidade a infecções: O leite materno fornece anticorpos que ajudam o bebê a combater doenças. A falta de amamentação adequada pode resultar em uma menor proteção imunológica, aumentando o risco de infecções. Problemas gastrointestinais: O leite materno é facilmente digerido pelo sistema digestivo do bebê. A introdução precoce de alimentos sólidos ou a substituição do leite materno por fórmulas pode causar desconforto intestinal, constipação ou diarreia. Alergias e intolerâncias alimentares: O leite materno ajuda a desenvolver a tolerância a diferentes alimentos, reduzindo o risco de alergias e intolerâncias. Bebês que não são amamentados adequadamente podem apresentar maior propensão a desenvolver alergias alimentares. Impacto no desenvolvimento cognitivo: Estudos sugerem que a amamentação exclusiva está associada a um melhor desenvolvimento cognitivo. A falta de amamentação adequada pode prejudicar o desenvolvimento cerebral e cognitivo do bebê. Aumento do risco de doenças crônicas: A amamentação adequada nos primeiros meses de vida pode ter um impacto positivo na prevenção de doenças crônicas na vida adulta. A falta de amamentação exclusiva pode aumentar o risco de obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão e outras doenças crônicas.

Material complementar:

Vídeo para pais atualíssimo, considerando os malefícios do celular e da falta de limites e o índice alarmante de aumento dos suic*dios em crianças e adolescentes:
https://youtu.be/wXPde553o-U?si=G3S5kMxQSA_ljI0r

https://www.ufsm.br/app/uploads/sites/518/2020/09/2014-Kruel-Souza-ing.pdf

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-03942010000300010

https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/4350/4350_5.PDF

https://www.psicanaliseclinica.com/amamentacao-psicanalise/

https://bibliodigital.unijui.edu.br:8443/xmlui/bitstream/handle/123456789/2894/ANA%20PAULA%20THEISEN%20TCC%20FINAL.pdf?sequence=1&isAllowed=y