Formação de Compromisso e Narcisismo - Fabio Rocha
A formação de compromisso move todo o trabalho do psicanalista. É algo como um “acordo” entre ego, superego e id (do conteúdo desejante que quer vir do inconsciente e da repressão a ele) que deixa alguns conteúdos inconscientes se manifestarem, porém não exatamente como está no inconsciente. É um compromisso pela sanidade, pois há uma pressão dos desejos inconscientes, dos conteúdos de grande carga pulsional para se tornarem conscientes. Há principalmente deslocamento e condensação (mas há também outros mecanismos de defesa). Deslocamento significando que os conteúdos são deslocados em algo mais aceitável pelo superego e pela sociedade. E há também uma condensação de vários conteúdos em um só elemento. Por isso é tão difícil o processo de análise. A própria palavra análise significa separação de um todo em seus elementos ou partes componentes. Daí vem o termo psicanálise, uma análise (decomposição) da psique. Portanto, a essência da psicanálise é ir desvendando o que o analisando traz como conteúdo consciente (figura representacional aceita), sabendo sempre que este conteúdo está deslocado e condensado. “Nunca é o que é”. Sempre há uma série de desejos condensados e deslocados. Esse desvendar não é um trabalho simples, requer tempo, técnica, cuidado e muita atenção, mas é fascinante.
Um exemplo de formação de compromisso: depressão. Um sintoma que seria o conteúdo manifesto, simbolizando um conjunto pulsional de desejos não expressos naquela pessoa que teriam que ser desvendados através da engrenagem da psicanálise. Além de sintomas, os conteúdos conscientes podem ser atos falhos, chistes ou sonhos.
Todos nascemos hipernarcísicos e crescemos buscando sempre o prazer para nós mesmos, mas o excesso disso chamamos de indivíduo narcisista. O narcisista é aquele que, devido a traumas, volta sua energia libidinal apenas para si mesmo. Muitas vezes, traumas ao voltar sua libido para elementos exteriores e se decepcionar, nos primeiros anos da infância de decepção com os outros (muitas vezes os pais). Com dificuldade de se relacionar com outras pessoas e espaços. É uma pessoa sem abertura para o outro e para um desenvolvimento saudável. Com enorme dificuldade de confiar no outro. De aceitar ajuda do outro. Fechado em si mesmo, sendo o centro de suas “atenções”. Pode gerar um sofrimento tamanho que leva o paciente para a análise. E aí já há uma abertura para a mudança - pelo cansaço de repetir esse movimento de se fechar.
É quando o papel da escuta do psicanalista é fundamental, de neutralidade e acolhimento. Geralmente, as primeiras são “testando” o analista, justamente para ver se pode não se decepcionar, se frustrar também com esse “investimento” para alguém fora dele mesmo. Nesse contexto, é importantíssimo observar que é possível haver uma nova forma de relação, na construção do setting analítico, alguém que escuta, que não abandona, e é importante lembrar que isso requer tempo. A transferência vai acontecendo e a confiança vai aumentando com o acúmulo de sessões. (Lembrando que o psicanalista deve seguir as regras: estímulo a livre associação, abstinência de opinar, neutralidade, atenção flutuante e amor à verdade) Essa nova forma de estar com o outro, de aceitação incondicional traz a chance do novo surgir na vida do analisando.
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