Transferências, pulsões e desejos - Fabio Rocha
Na primeira vez que Freud falou de transferência, foi no sentido de realizar nos sonhos desejos que não poderiam ser vividos acordados. Depois, falou da transferência em relações dos afetos de pai e mãe para novos relacionamentos. Mas vamos nos aprofundar aqui na transferência no setting analítico (espaço da transferência) repetimos fatos da infância, revivemos como adulto, ressignificando algo do passado. O que pareceu um abandono, por exemplo, do pai, para uma visão de que ele fez o que era possível na época. O inconsciente traz de volta imagens e informações da infância e através da elaboração do analisando e da superação de suas resistências. Há uma recriação do passado muito baseada no acolhimento e no afeto do analista (afeto através da escuta, com ética, liberdade e confiança e gradativamente - não é de uma hora para a outra, respeitando o tempo, a alteridade do analisando). A transferência é desse afeto das figuras importantes da infância do analisando (pai, mãe ou quem o criou diretamente, que Freud chama de “objetos primários”) para o analista. E a psicanálise pode transformar a vida das pessoas através de uma nova vivência e visão de seu passado. Sem transferência, não há psicanálise. A transferência vincula e aproxima.
As pulsões nascem no inconsciente e são sempre contingenciais, segundo Freud, nunca realizadas (sempre buscando prazer e realização). Acabam sempre mudando de um objeto representacional para outro, nunca dando uma satisfação total e nos mantendo em movimento (muito resumidamente, o que é chamado no budismo de “samsara”). Muitas vezes se mostram em desejos não bem aceitos pela sociedade, difíceis de lidar pelo analisando. Através de uma estrutura ética, de não julgamento e de acolhimento, o analista deve aceitar qualquer desejo do analisando e estimulá-lo a falar sobre tudo. A pulsão difere do instinto, que é necessário para nossa sobrevivência básica. Por exemplo: comer, beber água ou dormir. A não realização de uma pulsão gera sofrimento. Quanto mais energia psíquica colocada na realização de uma pulsão, maior o sofrimento.
Na contemporaneidade, onde o excesso de marketing e de redes sociais, o analisando se perguntar o que ele realmente quer é algo muito importante, daí a relevância da psicanálise. Passamos do desejo dos pais para o desejo do marketing, o desejo dos padrões, a competição (beleza, salário, viagens, sucesso etc.), sem nos fazermos esta pergunta básica. Através dos instrumentos da psicanálise, do olhar para si mesmo, muitas vezes pelos desejos da infância, podemos iniciar a tomar posse e acolher o nosso próprio desejo. Melhoramos essa relação conosco mesmo, perguntamos mais “por quê?” Com isso, as frustrações passam a trazer uma dor menor, diminuímos nosso sofrimento através de um novo olhar, utilizando novas ferramentas.
Dentro da teoria freudiana, há inicialmente 4 fases da teoria pulsional:
Prazer e agressividade ou violência: identificação dos reais desejos do analisando, sem julgamento dos mesmos (sexualidade e lidar com a raiva)
Autoconservação: melhor relação consigo mesmo e com o meio onde está inserido o analisando (reconhecimento, sucesso e fracasso - sobrevivência)
Pulsão de vida: como o analisando lida com suas frustrações e idealizações (relação com objetos representacionais - contingenciais - e com a sexualidade)
Pulsão de morte: aceitar a si (relação com angústias e fetiches - canalizar a pulsão para algo mais bem aceito socialmente)
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